Cigarro contrabandeado: na rota do crime na fronteira, Paraná concentra 49% das apreensões do Brasil


Maior parte do cigarro ilegal é feita no Paraguai, onde imposto sobre o produto é menor. Fórum Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP) divulgou ‘raio-x’ do mercado ilegal. Diferença tributária é ponto central do contrabando de cigarro, explica advogado
O Paraná concentrou quase metade (49%) das apreensões de cigarro contrabandeado registradas pela Receita Federal em 2022. No estado, 62% dos cigarros vendidos em 2022 vieram do contrabando – taxa muito acima nacional, de 41%.
Os dados fazem parte de um “raio-x” divulgado pelo Fórum Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP) sobre o mercado ilegal. Desde 2014 a pesquisa é feita anualmente pelo Instituto Ipec.
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O levantamento revela que, de todas as mercadorias apreendidas em 2022 pelo fisco no Paraná, 73% são cigarros contrabandeados.
O perfil da fronteira coloca o estado como ponto de destaque na rota dos contrabandistas. O preço do cigarro contrabandeado é considerado o principal atrativo para quem consome o produto irregular (entenda os motivos a seguir).
De acordo com a Receita Federal, de 1º de janeiro de 2023 a 30 de setembro, foram cerca de 58,4 milhões maços de cigarro contrabandeado apreendidos no Paraná. Nos últimos anos, os cofres estaduais perderam bilhões de reais com a sonegação fiscal fruto do contrabando do produto.
Fronteira estratégica para criminosos
O chefe da Divisão de Repressão ao Contrabando e Descaminho da Receita Federal no Paraná e em Santa Catarina, o auditor-fiscal Tsuyoshi Ueda, explica que as características da fronteira paranaense aumentam o desafio do combate ao contrabando na região.
Na região norte do país, por exemplo, há trechos de fronteira em que a própria característica geográfica impede ou dificulta esse tipo de crime. Porém, no Paraná, principalmente a fronteira com o Paraguai, é extremamente movimentada e conhecida.
Um dos exemplos é a Ponte da Amizade, que liga Foz do Iguaçu, no oeste paranaense, à Cidade do Leste, no Paraguai.
“Circula muita gente todo dia, muito veículo, muito caminhão, é um volume exagerado de trânsito de mercadorias, seja no comércio formal, ou no informal. E nós temos uma característica também especial ali que é o Lago de Itaipu com vários pontos clandestinos. São portos clandestinos que se instalam com quadrilhas, com organizações criminosas que atuam na região, e isso faz com que o Paraná seja privilegiado nessa questão da criminalidade”, explica.
O g1 procurou a Polícia Federal e questionou a corporação sobre o combate ao crime no estado. Porém, a corporação não quis se manifestar.
A Ponte da Amizade, entre Brasil e Paraguai
Prefeitura de Foz do Iguaçu/Divulgação
Bilhões deixam de ir para os cofres públicos
O contrabando de cigarro tem um preço. Ao entrar no país de forma clandestina, o produto deixa de ser tributado, ou seja, o poder público perde de arrecadar impostos cobrados sobre o item.
Só em 2022, o contrabando de cigarro fez com que Paraná deixasse de arrecadar cerca de R$ 1,22 bilhão – o valor superou a arrecadação com o mercado legal no período, de cerca de R$ 800 milhões, conforme os dados do fórum.
Se considerados os últimos seis anos, o prejuízo gira em torno de R$ 6 bilhões:
A conta considera valores que deveriam ter sido arrecadados com o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS).
O advogado e presidente do Fórum Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP), Edson Vismona, explica que um dos grandes estímulos ao contrabando de cigarro é a diferença de impostos cobrados pelo produto no Brasil e no Paraguai – fabricante da maior parte os produtos apreendidos.
No país vizinho, os impostos sobre o cigarro giram em torno de 13 a 22%, enquanto a taxa cobrada dos consumidores brasileiros é de cerca de 70 a 90%, dependendo do estado.
“O fumante, especialmente de baixa renda, ele vai procurar o mais barato e ele vai encontrar o contrabandeado, ele vai no ponto de venda e fala eu quero o estrangeiro, ele nem pensa em comprar o brasileiro, porque é muito caro em comparação com o contrabandeado.”
Vismona destaca que as alíquotas aplicadas no Brasil sobre o cigarro estão dentro da média defendida pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
Pesquisa revela que quase metade do cigarro ilegal entrou no Brasil pelo Paraná, em 2022
Pixabay
Cigarro financia outros crimes
O advogado e presidente do Fórum Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP) afirma que o contrabando de cigarro financia organizações criminosas por ser considerado um crime de baixo risco e alto lucro.
“Nós identificamos em um dos documentários que nós fizemos, no meio da carga você tinha armas, cocaína, cigarros, tudo junto, é a mesma logística. Então, está tudo interligado. Quem fala ‘ah, mas é só contrabando de cigarro’, não é verdade. As ações policiais demonstram isso, a interação direta do contrabando de cigarros com arma, munição e cocaína e drogas em geral.”
Barato que sai caro
A pesquisa realizada pelo Ipec Inteligência no ano passado revela que, no Paraná, o cigarro contrabandeado era vendido por preço 74% mais barato do que o produto legal.
Além de não passar pelo fisco, o cigarro contrabandeado não passa por autoridades reguladoras como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), aumentando ainda mais os riscos do consumo de um produto cuja procedência não é certificada.
O chefe da Divisão de Repressão ao Contrabando e Descaminho da Receita Federal no Paraná e em Santa Catarina destaca que comprar o cigarro contrabandeado prejudica a economia e, consequentemente, traz reflexos na saúde e na educação públicas, por exemplo.
O combate ao contrabando, argumenta o auditor-fiscal, passa pelo trabalho das polícias e do fisco, mas também da conscientização das pessoas.
“Fazer com que as pessoas entendam que, quando você compra produto irregular, especialmente falando da questão dos cigarros contrabandeados, ele não está simplesmente levando alguma vantagem num preço menor, ele está prejudicando o país, está prejudicando a economia, está prejudicando a saúde pública, porque algum reflexo na saúde pública, no atendimento numa UPA, no hospital, vai acabar acontecendo”, alerta.
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